Por: Ricardo Henriques Leal
Nos últimos anos o tema Inovação passou a ser um dos mais comentados na sociedade em geral e nas empresas e universidades em particular. Praticamente todos os dias somos apresentados a novas tecnologias que modificam nosso dia a dia com uma frequência nunca vista. Alguns exemplos: (1) celulares e televisores lançados alguns anos atrás estão hoje obsoletos; (2) DVDs e CDs, que relativamente há pouco tempo substituíram discos de vinil, fitas cassetes e disquetes, já são muito pouco utilizados, frente à concorrência dos aplicativos de streaming de música e filmes, serviços de armazenagem na nuvem e novos laptops sem leitor de CD/DVD. Também os (3) aplicativos dos mais variados objetivos, alguns impactando na velocidade de comunicação e no futuro de cartas e e-mail, outros concorrendo com o setor hoteleiro, com o uso de táxis e outros modificando a compra e entrega de bens e serviços com forte impacto em lojas físicas. Por fim, cabe destacar também as (4) aplicações iniciais de Inteligência Artificial que começam a ser utilizados na produção industrial e diagnósticos médicos.
A previsão para os próximos anos, com a implantação da Tecnologia 5G e a consequente ampliação de Inteligência Artificial, é uma aceleração muito grande no desenvolvimento e implantação de novas tecnologias na indústria, nos serviços e no dia a dia nos empregos e residências, com um número crescente de atividades em todas essas áreas sendo realizadas automaticamente, ou por robôs ou por trabalhos remotos. E o que todas essas tecnologias inovadoras têm em comum? Todas elas foram fruto de desenvolvimentos científicos e tecnológicos que evoluíram para aplicação industrial ou nos serviços. Essa é a característica básica da Inovação, ela precisa ser utilizada pelo mercado ou pela sociedade.
A definição de Inovação, baseada no Manual de Oslo, que estabelece mundialmente os conceitos de Inovação é: “Implantação de um produto (bem ou serviço) novo ou significativamente melhorado. O produto ou processo deve ser novo ou substancialmente melhorado para a empresa ou sociedade, não sendo necessariamente novo ou melhorado para o mercado ou setor de atuação”. Nesse sentido, a Inovação não precisa ser radical, quando se tem uma grande mudança tecnológica, ou disruptiva, quando se tem uma mudança no modelo de negócios, sendo a grande maioria das inovações do tipo incremental, com pequenas melhorias nos processos em uso nas empresas e na sociedade.
Qual a importância dos Institutos de Ciência e Tecnologia (ICTs) no desenvolvimento de inovações?
Os ICT’s, que congregam Universidades e Institutos de Pesquisas, são as instituições onde se desenvolve a maior parte das pesquisas científicas e tecnológicas no mundo, porém muitas dessas pesquisas inovadoras não chegam a serem implantadas no mercado ou na sociedade e, portanto, não são inovações dentro do conceito do Manual de Oslo. Elas acabam sendo importantes para publicações, defesas de teses e dissertações e formação de pessoal de alta capacitação para a academia e para o mercado, porém essas pesquisas muitas vezes não chegam à sociedade e, portanto, não são inovações.
Os países que tiveram mais sucesso em transferir desenvolvimentos científicos e tecnológicos para o mercado e para a sociedade foram aqueles que trabalharam melhor a chamada “Tripla Hélice”, conceito desenvolvido na década de 1990 no qual a inovação é fruto de uma combinação de 3 atores: a Indústria, trazendo recursos e as necessidades e demandas do mercado e da sociedade, a Academia desenvolvendo as tecnologias e os Governos financiando projetos e programas de Inovação e promovendo a interação entre empresas e academia.
Como está a Inovação no Brasil?
Nos últimos 30-40 anos, o Brasil desenvolveu o seu parque científico e tecnológico, com a ampliação da oferta de novos ICT’s e Programas de Pós-Graduação. Introduziu um sistema de avaliação de professores e programas de pós-graduação fortemente baseado em publicações e investiu na modernização de seus laboratórios de pesquisa. Como resultado desse esforço o país vem ocupando já há alguns anos uma posição entre 10° e 15° no ranking mundial de ciência, baseado em publicações e citações, o que é relativamente bom considerando o nível do PIB brasileiro e o gasto do país em P&D, não muito alto.
Todavia, nos rankings de inovação, o Brasil está sempre acima do 60° lugar, o que caracteriza a dificuldade do país em levar o desenvolvimento científico e tecnológico produzido no país para o mercado e a sociedade em geral, mesmo com diversas iniciativas nos últimos 20 anos de criar mecanismos legais que favoreçam o crescimento da inovação.
Entre esses mecanismos legais aprovados nos últimos anos, destacam-se: (1) Lei de Inovação de 2004, regulamentada em 2005, atualizada em 2016 e regulamentada em 2018, que dá amparo legal a diversas iniciativas facilitando a integração universidade-empresa, tais como professores de dedicação exclusiva de ICT’s públicas participarem de projetos de pesquisa com empresas privadas e também participarem de empresas privadas como sócios; empresas desenvolvendo projetos de inovação em conjunto com ICT’ públicas utilizarem laboratórios dessas ICT’s; patentes desenvolvidas em ICT’s públicas podem ser cedidas a empresas privadas, etc… (2) Leis de incentivos fiscais, tais como Lei do Bem e Lei de Informática. Ainda assim, o crescimento da Inovação no Brasil é muito tímido, certamente influenciado pela relativamente pouca utilização da “Tripla Hélice”, embora possam ser citados alguns casos de interação ICT’s – empresas de grande sucesso: (1) Embrapa- Agronegócio; (2) Coppe-Petrobrás; (3) Embraer – CTA/ITA; (4) Parques Tecnológicos, por exemplo, no Recife, na UFRJ, em Florianópolis, São José dos Campos, entre outros.
Nos últimos anos algumas iniciativas apontam para uma melhora nesse ambiente de inovação que pode trazer resultados mais concretos nos próximos anos: (1) crescimento no número de startups, de 600 registradas em 2010 para mais de 13.000 em 2020, a maioria de ideias inovadoras, sendo que a partir de 2018 mais de dez startups brasileiras passaram a serem unicórnios, ou seja, valerem mais de US$ 1 bilhão, entre elas IFood, Nubank, 99, Loggi, Quinto Andar, PagSeguro; (2) Grandes empresas têm lançado desafios buscando soluções para diversas necessidades de inovação via projetos desenvolvidos por startups e/ou grupos de pesquisa em ICT’s; (3) Empresas têm buscado a Inovação Aberta através de Hubs de Inovação próprios ou associados a outras empresas, tais como Mining Hub, de empresas minero-metalúrgicas, Energy Hub para projetos de energia, Fábrica de Startups, Cubo do Itaú, entre outros.
Com essas iniciativas e o entendimento de que a inovação será a grande responsável pelo sucesso dos países nos próximos anos, espera-se que a inovação se desenvolva mais rapidamente no Brasil nos próximos anos.
Ricardo Henriques Leal é Diretor da Agência de Inovação da Universidade Federal Fluminense (AGIR/UFF) e Professor Associado do Departamento de Engenharia Metalúrgica e Materiais da Escola de Engenharia Industrial Metalúrgica de Volta Redonda (EEIMVR) também da UFF, onde leciona desde 1986. Também é conselheiro da Associação Brasileira de Metalurgia, Materiais e Mineração (ABM).